Luiz Paiva de Castro
PROSAS II
Capa da Revista Kaleidós, número 1 – Dez. 2003, AMEF
Contra-capa da Revista Kaleidós, número 1 – Jan. 2003
Rosa, de Barbacena, Minas Gerais
Rosa, de Barbacena, Minas Gerais
Pequena estação de trem, parada, em Cabangu.
Rua XV de Novembro, Minas Gerais.
Cidade das Rosas, de Barbacena, Minas Gerais
Fortaleza, Ceará – Sábado 22 de dezembro de 2001
Infinito Instante
Infinito Instante é o livro de poemas do professor J. Cimino, destino do próprio autor, como diz na contracapa: “Alguns de seus textos são meio poesia, meio metafísica”. Inspira-se sempre, numa visão pessoal, em grandes mestres da filosofia.
Como membro da Academia Mantiquieira de Estudos Filosóficos (e também da Academia Barbacenense de Letras), membro correspondente, conheço o autor, J. Cimino, professor de Filosofia e outras pessoas responsáveis pela edição de Infinito Instante, a escritora Zilda Moreira de Castro e o professor Mário Celso Rios, presidente da ABL - Academia Brasileira de Letras.
O autor de Infinito Instante, o professor J. Cimino, conheci pessoalmente durante as festividades dos 50 anos da EPCAer, de Barbacena, em maio de 1999.
O jornal da AMEF e a correspondência com o professor José Cimino e outros escritores de Barbacena, aqui citados, conhecedor dos trabalhos de Zilda Moreira de Castro sobre Guimarães Rosa, nos fez olhar para Barbacena como um centro cultural de importância o que, infelizmente, não acontece hoje com Nova Friburgo, e acontecia no Império e início da República.
O livro se divide em três pares: I - Meu ser no Mundo, II - Marcas Humanas, e III - Mundivivência, com um preâmbulo - Barbacena.
A capa já nos leva a Barbacena, cidade das rosas e terra de Lívio Marques e os seus. Podemos dizer, sem desconsiderar as individualidades, que a turma pioneira de Barbacena tem a sua força e densidade de companheirismo e cultura, por suas ligações profundas com a misteriosa Barbacena, espírito etéreo na subida da Mantiqueira, feita pelo pai de Santos Dumont, o engenheiro Henrique Dumont.
“Por sobre as montanhas, diz o preâmbulo, a gente espia longe e estende as mãos para buscar o futuro além das nuvens”.
Mas como chão, terra aqui e agora, a montanha esconde seu rosto na manhã, satisfeita de sua própria imagem: “O sangue, fervor correndo nas veias do povo, ainda arde em anseios. Mas, por que o futuro, se a felicidade já aqui mora?” (pág. 19).
Há indagações do livro de J. Cimino, as perguntas que povoaram o mais filosófico de nossos poetas, Augusto dos Anjos, ou Honório em Barbacena, estudado por Zilda Moreira de Castro. O poema “Vita Nostra” (pág. 83) exemplifica esta ligação entre a ciência e a filosofia, muito diferente da moderna época de TV, onde desaparecem borboletas e sapos nas montanhas, pelos raios ultravioleta oriundos da destruição da camada de ozônio. “O segredo do universo está dento do cofre da vida” “O que é a vida, vibrando em minhas células,/ nas plantas e nos animais,/ desde o leão até os protozoários?/ Ela palpita nos neurônios do meu cérebro/ e no ínfimo quark”. “É a intenção oculta do cosmos,/ cuja seiva caminhou,/ caminhou,/ até o desabrochar da consciência”. E Eu e outras poesias (edições sucessivas até alguns anos depois do aparecimento da televisão), diz o paraibano Augusto dos Anjos, que morreu em Leopoldina, Minas Gerais: “Sou uma sombra,/ venho de Outras eras,/ do cosmopolitismo das moneras,/ pólipo de recônditas substâncias/ larvas do caos telúrico...” (reprodução de memória). Esta poesia forte de Augusto dos Anjos, misturando ciência, filosofia, em uma visão pessoal, está no grande poeta Moacyr Félix, na década de 60, “O Pão e o Vinho”, Editora Antunes, colocando aqui nos trópicos, Hölderlin e Heidegger, desejando saber da profundidade do ser nele e no movimento cósmico, de repente sufocado por forças de difícil localização, como se estivéssemos vivendo a invasão dos marcianos. Luiz Heitor Paiva de Castro, de suas experiências de ver as estrelas, em Nova Friburgo, em “Relíquias do Sol (Dublin Poesias, 1968), traz perguntas sobre a vida estelar e o homem. Como em Auriga: “Pastor de campos noturnos, ele guarda no grave semblante o segredo das eras. Entre os homens, como o tempo, nas casas de pedra da aldeia, ele passa, indiferente; mas ao ver as lágrimas do viajante perdido, entre as mudas montanhas se inclina, e o devolve, em promessas, à antiga jornada” (Auriga, pág. 76).
Este motivo constante de olhar o universo, está presente em Jorge Tufic em Boleta, a onça invisível do universo.
O poeta J. Cimino sintetiza em Infinito Instante, esta busca do ser pelo ser (pág. 87): ... Longa é a noite/ com astros/ caminhando em marcha lenta, enquanto a mente busca,/ muito além das estrelas/ uma resposta/ para as interrogações/ que atormentam o espírito./ ... As horas são gélidas/ quando esperança não há/ Amargas,/ se os horizontes se fecham./ São tristes,/ se o tempo se faz hibernar,/ nublado./ Se me enclausuro/ no esquecimento da vida/”.
O poeta cearense Francisco Carvalho em “As Verdes Léguas” (2ª edição, Casa de José de Alencar, Fortaleza, 1997, programa Editorial), continua o tema do ser, esquecido no aqui e agora metálico, ou na alvenaria do poder em Ária Primária (pág. 99): “O vento ancorado/ nos mastros do morto/ A seta do pássaro/ nos olhos do potro./ ... O vento invencível/ a límpida teia/ da aranha do orgasmo/ nas crinas de pégaso./ A flecha do vento/ varando a memória/ do tempo - esse invento/ da alma ilusória./”.
J. Cimino em “O Sol” (em verdade, além do sol), responde às questões dos poetas, por eles mesmos respondidas em seus livros: “Para eles (planetas) alonga os braços de luz,/ o calor reparte/ e a vida latente/ na célula desperta./ No meio,/ nos espaços sem vazios;/ a quintessência (energia primordial, conforme a Medicina Tradicional Chinesa e explicada por J. Cimino na página 149) do Universo, quiçá da própria vida”.
Resposta que o grande poeta goiano, que duplamente me aquinhoava com a referência, à mão, de Luiz Heitor Paiva de Castro como poeta, aqui trazido, e pelo poema “A Árvore do Cerrado”, a mim dedicado, trazendo a imagem da inocência ruidosa de Carlitos, coloca outra resposta para esta questão respondida por J. Cimino, de outra forma (Poesia, José Godoy Garcia, Thesaurus, 1999, Brasília, pág. 76): “O rio passou mil anos sobre a pedra/ e no fim de uma semana/ ele pediu ao pássaro/ que o ajudasse a tirar de sua memória/ o remorso./ Depois de muitas horas/ tanto o rio como o pássaro decidiram/ que passar sobre o corpo de uma pedra/ não era um mal. era a vida da pedra/ que não sabia nem cantar e nem voar./”.
O filósofo que bebe na Grécia, as suas entanhas da quintessência, é poeta de Minas, e no Desterro-do-Meio, sabe da questão do Ocidente, muito mal conduzuda pelos romanos e os anglo-saxões, e intui a intimidade das cavernas de Minos com as cavernas afegãs, pela vinda do Himalaia até o Mediterrâneo, movimento inverso ao posterior movimento de Alexandre, O Grande, morto precocemente. Ele não se esquece da cultura grega, de muitos povos, e aberta para o saber como a cultura quinhentista lusitana. Foram estes, no Ocidente, e Luíx XIV, e os autro-húngaros, que tentaram resgatar a idéia da renascença perdida para os metais, com que Guilherme de Orange aprisionou de novo a barca do Ocidente, sem seu destino e na sua Tempestade - o metal e a destruição.
J. Cimino está atento a seu passado, à Tia Inês posta em sossego (“Estavas Linda Inês posta em sossego, de teus anos colhendo doce fruito...”). Doce como a Inês camoniana, a Inês, Tia Inês, é bela: “As dores lembradas do tronco não te acendem o ódio.” (Pág. 24).
Como Camões lírico aparece com enorme força no épico Os Lusíadas, J. Cimino alcança estas alturas de por a Pátria em versos libertários, que Cecílica Meireles trouxe em “Romanceiro da Inconfidência”. Em “Desconcerto” (pág. 109), o filósofo-poeta se apruma na concisa defesa da Pátria brasileira, terra e gente: “Roda gigante de minério-economês/ sufoca a raiz dos ideais./ Sobre a lousa/ dos patriotas, pousam coroas de cravos/ e a Nação ostenta um rosto frio e pálido.// O horizonte é fechado e obtuso./ Um vento corrosivo talha a verde planta./ O ímpeto alado de ousadas aves/ maça na fonte os anseios do homem ético.// O povo é tesouro soterrado. Dores/ impostas do alto descem e os que beijam/ o Pendão de outras terras/ alienam na arena do festim global.// No campo e na cidade, donos do poder/ costuram a política de linhas tortas./ Baixa sobre a Pátria a sombra do desânimo/ que inêmore vive à margem de sua história.//”.
Mas o filósofo não está determinado pela História. Isto acabou: “O Tempo”, poema final do livro, pág. 139 - final do poema: “Só ele é tempo./ Fora dele, / o que há/ é um agora/ é um agora de ser fluindo/ sempre para o novo./ Ou não seria/ também ele,/ um 'instante'/ passageiro do imenso comboio/ da evolução dos cosmos?”.
Livro para ser lido e posto na cabeceira da cama, para ler de novo, como faziam os antigos, saboreando a vida - Infinito Instante, J. Cimino, Edições AMEF, Belo Horizonte, Minas Gerais, 2001.
Luiz Paiva de Castro
Ensaísta
Em artigo publicado no Sabático, O Estado de São Paulo, 30/03/2013, Walnice Nogueira Galvão, professora emérita, da USP, – O Retrato de Um Civilizador, traz importante registro da atividade intelectual, cultural e humana, do morador, para sempre, da travessa da Estrela, em Belém, – Benedito Nunes.
Aqui, nada a dizer sobre o artigo e a grande presença, energética, quase visionária, do jardineiro, cuidando, após a Semana da Arte Moderna, do “bolsão cultural" de Belém, do seu jeito e no seu caminho, a que se refere a escritora, a densa estilística alemã, com prêmio Jabuti, em 1987, sobre a obra de Heidegger, aqui apenas uma referência, breve.
O que cabe cuidar de ver, nesta pequeno istmo, aberto apenas para lembrar, – as lembranças, hoje, necessárias, da existência, em 2003, – da revista Kaleidós, da AMEF, Barbacena, dirigida pelo professor José Cimino, e que adiante não seguiu, após os primeiros passos, dois cuidados números, – um grande grupo de colaboradores e membros da Academia Mantiqueira de Estudos Filosóficos, pelas inúmeras dificuldades em se fazer, e dar curso, após a nascente, a fluxos culturais, assim, – que os grandes rios, como o Amazonas, vão sendo, após o filete da origem, no nevado Mismi, no Peru, energizado, pouco a pouco, com a chegada, contínua, de afluentes, até quase a sua foz, no Atlântico Amazônico.
Nem isto a tanto, em cultura, literatura, arte, – a civilização, assim, idealizada pelos humanistas, após a Renascença, se mostrou quimérica, não só pelas guerras, simplesmente apavorantes, – nem uma enorme manada de elefantes enlouquecidas, de antigos tempos, poderia supor, de longe, tal destruição, – a do século XX, nem isto a tanto, pois, – que, quem pode saber, – a economia a puxar o trem, agora virtual (na aparência), – o materialismo, de fato um somatório de egoísmo, onipotência, crueldade, e desespero, à morte vazia, fruto de biografias, apenas contabilizáveis, e a inexorável visita, adiante (próximo) da visita do personagem do Sétimo Selo, derrubou, num só estirão de boliche, jogo rápido, – para uma geração, talvez, – memória dos lugares, consistência familiar, palavra empenhada (museu, hoje), valores sagrados, afeto, muito e muito mais.
Inclusive a cultura, fruto consistente do pensamento, próprio do homem, que seria, por certo, a sua diferenciação fundamental, dos outros seres vivos, fácil de constatar, – e difícil ficou, que a sua origem divina passou a ser questionada pelos próprios homens, e é ela inerente à fé, às dificuldades e limites da ciência humana, em relação ao cosmos, – e se não se tem mais a natureza antiga do indivíduo, – a massa e a excelência, nomeada, ao acaso, – tomaram todos os espaços, – Deus não é mais o convívio sereno dos antigos para o céu, passou a ser, quando é lembrado, muitas vezes um chamamento para o socorro, no desespero humano.
Os “ bolsões de cultura", aqui, na história, recente, do país, após a Semana de Arte Moderna, são anotados pela articulista, da USP. E espanta como, Brasil afora, se responde a novos tempos, se desperta o homem de Altamira, que espantou Picasso. A súmula, dita rápida, é, de fato, extensa, não se restringindo a Rio, São Paulo: Madrugada, no Rio Grande do Sul; Arco e Flexa (1928), na Bahia;A Revista, em Minas. Apenas uma questão existe, uma dúvida, que não é posta aqui, como oposição ao artigo, consistente: no paralelismo, milenar, e na difusão, crescente, no século XX, – pode-se chegar, adiante, aos mesmos resultados da Semana da Arte Moderna, em São Paulo, por olho próprio, interno ou externo, – pelo menos em alguns casos, ou pela difusão, que nunca tem mão única. A questão carece de importância pela relevância, em si, da Semana da Arte.
O importante, mesmo, não é só o conteúdo, mas a forma viva, irrequieta, do ser humano, como pensamento, cultura, invenção, de criar, na história, a partir da clareira, como pos o pensador alemão, estudado por Benedito Nunes, filósofo e estudioso da literature brasileira (nunca o desmatamento e sua aridez) – que estava presente tanto na Semana de Arte Moderna como em subsequentes, e já distantes manifestações culturais, – país outro, sujeito à vertigem do avião moderno, – isto é, os que chegaram para negócios de cidade, sem qualquer desejo, explicitado, de fazer morada no país (um direito, inquestionável, do ir e vir), e ficar, se misturar à paisagem, em trocas, – o que, sem dúvida, tirou das cidades maiores, por perda de memória e identidade, o chão próprio, dos Lima Barretos e dos Cartolas, dos Marques Rebelo e dos Vinícius, – deixando este legado de invenção, em boa parte, para habitantes, capazes de olhar o céu e o mundo, pisando em suas antiguidades de província, – o que já era e sempre foi, o guardado eterno de Benedito Nunes, na Travessa Estrela, e foi o caminho, em 2003, com Kaleidós, e, antes, com o jornal, – do professor, filósofo e poeta, José Cimino, e o grupo da AMEF, em Barbacena, fazem dez anos, em 2013. Aqui, reverenciado, como uma das boas, vivas, sólidas, caminhos da cultura pelo conteúdo das revistas, a filosofia, no centro, e das reuniões, o café filosófico, na histórica Barbacena, terra, de fato, na época de seu nascimento, – de Alberto Santos-Dumont.
Benedito Nunes, filósofo, crítico literário e professor – em sua biblioteca, na travessa da estrela, em Belém, Pará.
Travessa da Estrela, em Belém, Estado do Pará.
Charles Chaplin, em "La Quimera Del Oro" ("Em Busca do Ouro") – cinema mudo, 1925.
Capa da Revista Kaleidós, número 2 – Dez. 2003, AMEF, Barbacena, Minas Gerais
Contra-capa da Revista Kaleidós, número 2 – Direção do professor e filósofo, José Cimino.
Rosa, de Barbacena, Minas Gerais
Rosa, de Barbacena, Minas Gerais
Rosa, de Barbacena, Minas Gerais
Fazenda Cabangu, Avião da Força Aérea Brasileira.
Fazenda Cabangu, casa onde nasceu Santos_Dumont.
Estação de trem, em Barbacena.